Transexuais e o uso de banheiros públicos

No último dia 24 de junho o Tribunal Regional do Trabalho da 23ª Região (Estado do Mato Grosso) publicou notícia acerca de uma decisão judicial de primeira instância que entendeu que “trabalhador transgênero tem direito de usar vestiário feminino”. Razão disso, indeferiu o pedido de danos morais por violação da privacidade de uma funcionária, apontando que “eventual desconforto da reclamante, advindo de convicções sociais e religiosas, não podem configurar dano moral”.

Antes de mais nada, é preciso ter em mente o equívoco no título da notícia veiculada no portal oficial, já que não se trata de trabalhador transgênero, mas sim transexual. Dito isso, há que se delimitar algumas questões.

A primeira delas é que a Resolução nº 1.955/2010 do Conselho Federal de Medicina aponta, em seu art. 3º, que “a definição de transexualismo obedecerá, no mínimo, aos critérios abaixo enumerados: 1) Desconforto com o sexo anatômico natural;2) Desejo expresso de eliminar os genitais, perder as características primárias e secundárias do próprio sexo e ganhar as do sexo oposto; 3) Permanência desses distúrbios de forma contínua e consistente por, no mínimo, dois anos; 4) Ausência de outros transtornos mentais.”

Isso posto, além de o transexualismo ser uma doença (está catalogada na CID 10 sob a rubrica F-64.0), mais precisamente um transtorno de identidade sexual, resta evidente que uma de suas marcas é o “desejo expresso de eliminar os genitais”. Contudo, vários dos nossos tribunais pátrios têm – equivocadamente – decidido que é possível fazer a retificação do registro civil para alterações no prenome e no sexo mesmo sem a cirurgia de transgenitalização.

No caso dos autos, “uma testemunha confirmou que, embora a pessoa em questão possuísse órgão sexual masculino, se apresenta como mulher, tendo seios e usando cabelos compridos.” Nestes termos, o que se nos apresenta, aqui, é uma pessoa que, embora com aparência exterior de mulher, ainda carrega consigo a genitália masculina – talvez por isso, inclusive, a autora da ação lhe tenha caracterizado como homossexual.

Fato é que, atualmente, vários são os homens homossexuais que fazem implantes de silicone para conseguir seios e glúteos parecidos com os das mulheres, mas isso sem perder sua identidade física masculina (permanência do pênis). Há, ainda, mulheres homossexuais que recorrem à mastectomia (retirada total das mamas) e fazem uso de testosterona para aparecimento de pelos e aumento do tom grave na voz, mesmo continuando com a cavidade vaginal. Em ambos os casos tem-se mais propriamente a travestilidade, ou seja, a combinação de caracteres externos de ambos os sexos numa mesma pessoa, muitas vezes sem uma identificação social precisa – ora preferem ser tratados como homens, ora como mulheres.

Feitas essas considerações, voltemos ao foco desse breve texto, que é abordar o uso de banheiros públicos (ou de uso coletivo) por transexuais – e mesmo por travestis. Pois bem.

Os banheiros de uso coletivo – sejam eles em repartições públicas, escolas, academias de ginástica, condomínios residenciais ou locais de trabalho – são, hoje, divididos em “masculino” e “feminino”. Ou seja, os homens (e somente eles) usam o banheiro masculino, e as mulheres (e somente elas), o feminino.

Tal divisão serve para preservar a intimidade e a privacidade dos usuários, e, embora a pós-modernidade tente relativizar essas categorias, as pessoas, em seus relativismos morais, acabam por buscar se enquadrar a eles.

Para ficarmos com um módico exemplo, eu (homem) tenho o direito de dividir o banheiro apenas com homens; mesmo porque, por ser casado, não quero ver outras mulheres despidas que não minha esposa. Não se trata de conservadorismo, mas de respeito à minha consorte (um dever estampado no art. 1566, V, do Código Civil de 2002). Por sinal, recorrentes são as “pegadinhas” na TV em que uma mulher invade o banheiro masculino, deixando os homens com nítida vergonha e constrangimento!

Do mesmo modo, uma mulher também tem o direito de não dividir o banheiro com uma pessoa que, conquanto aparentemente mulher, seja dotada de genitália masculina. Do contrário, estar-se-ia obrigando uma mulher a se desnudar na frente de um homem!

Outrossim, um homem transexual que extirpa o pênis não deixa de ser homem – nem mesmo, por completo, anatomicamente -, porquanto permanece com todos os órgãos reprodutores masculinos e sequer potencialmente alcançará o status de gestante. A retirada do pênis serve apenas para minorar o transtorno mental e comportamental da doença. Por outro lado, o homem transexual que insere os seios passa a ter a aparência feminina, não sendo crível que use os banheiros reservados aos homens.

Mas, então, como resolver a questão, já que a categorização “masculino” (leia-se “homens com compleição masculina”) e “feminino” (leia-se “mulheres com compleição feminina”) não é capaz de subsumi-los?

Uma solução plausível, e que não viola a privacidade de homens e mulheres, é a criação de mais dois enquadramentos: locais para uso de “homens com compleição feminina” e de “mulheres com compleição masculina”.

Entendemos, com isso, que com a previsão desses quatro locais abarcar-se-iam as complexidades que a atual conjuntura social nos revela.

Manual Prático de Direito Religioso
(465 páginas)

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.