A assistência religiosa nas prisões e as disposições constitucionais no Brasil

A Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984, denominada Lei de Execução Penal (LEP), é parte da legislação vigente que regula o direito à assistência religiosa nas prisões brasileiras.

Por ser anterior à Constituição Federal (CF) de 1988, é de se supor que a LEP orientou o Legislador em garantir, constitucionalmente, o direito à assistência religiosa conforme o art. 5º, inciso VII, da CF: “é assegurada, nos termos da lei, a prestação de assistência religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva”.

No entanto, se se considerar a legislação de execução penal anterior à LEP, que tem suas principais regras na Lei nº 3.274, de 02 de outubro de 1957, denominada Normas Gerais do Regime Penitenciário (NGRP), é possível reconhecer que os preceitos constitucionais que orientaram tais normas também traziam garantias à assistência religiosa nas prisões brasileiras.

É assim que consta na CF de 1946 do qual originaram-se NGRP. Nesse texto constitucional é firmado em seu art.141, parágrafo 9º: “Sem constrangimentos dos favorecidos, será prestada por brasileiro (art. 129, nº I e II) assistência religiosa às forças armadas e, quando solicitada pelos interessados ou seus representantes legais, também, nos estabelecimentos de internação coletiva”.

Em seguida, na CF de 1967, sob o qual também surgiram as NGRP, há o seguinte texto no art. 150, parágrafo 7º: “Sem constrangimentos dos favorecidos, será prestada por brasileiros, nos termos da lei, assistência religiosa às forças armadas e auxiliares e, quando solicitada pelos interessados ou seus representantes legais, também nos estabelecimentos de internação coletiva”.

E, ainda, orientando as NGRP, a Emenda Constitucional (EC) nº 1, de 17 de outubro de 1969, que edita o novo texto da CF de 24 de janeiro de 1967, apresenta em seu art. 153, parágrafo 7º: “Sem caráter de obrigatoriedade, será prestada por brasileiros, nos termos da lei, assistência religiosa às forças armadas e auxiliares, e, nos estabelecimentos de internação coletiva, aos interessados que solicitarem, diretamente ou por intermédio de seus representantes legais”.

Assim, verifica-se que os textos constitucionais sob os quais vigiram as NGRP fazem referência à assistência religiosa relacionando-a as forças armadas e suas auxiliares, e somente por solicitação dos interessados ou seus representantes legais, tal assistência se estenderia aos estabelecimentos de internação coletiva.

Nesse sentido, as NGRP não abrigaram o direito à assistência religiosa, fazendo apenas menção aos ensinamentos religiosos como parte da educação moral a que deveriam submeter-se os encarcerados, conforme se verifica no art. 23 das NGRP: “Na educação moral dos sentenciados, infundindo-se-lhes hábitos de disciplina e de ordem, também se compreendem os princípios de civismo e amor à Pátria, bem como os ensinamentos de religião, respeitada, quanto a estes, a crença de cada qual”.

Este art. 23 é complemento do art. 1º, inciso XIII, que estabelece: “São normas gerais de regime penitenciário, reguladoras de execução das penas criminais e das medidas de segurança detentivas, em todo território nacional: (…) XIII – A educação moral, intelectual, física e profissional dos sentenciados”.

A Exposição de Motivos à LEP, que data de 09 de maio de 1983, considera em seu item 184 que as NGRP “não são verdadeiras normas jurídicas: materialmente, porque ineficazes nos casos concretos e, assim, inaplicáveis; formalmente, porque não contém o elemento de coercibilidade na sanção para o descumprimento do comando emergente da norma. O referido diploma é sistematicamente ignorado, e ao longo de sua existência (…) não ensejou o desenvolvimento da doutrina nem sensibilizou juízes, tribunais e a própria administração pública”.

Vê-se, portanto, que mesmo constando nos textos constitucionais há mais de 70 anos, a assistência religiosa tornou-se direito dos presos somente há pouco mais de três décadas, a partir de 1984 com a LEP.
E, mais recente, há cerca de 16 anos, a prestação de assistência religiosa nas prisões brasileiras tornou-se um direito às lideranças religiosas, a partir da Lei 9.982, de 14 de julho de 2000.

Assim, no contexto da história das prisões no país, a assistência religiosa apenas mais recentemente tornou-se um direito reconhecido aos presos e sua prestação garantida nos termos da lei às lideranças religiosas.

De uma forma geral, a sociedade brasileira tem muito que amadurecer em relação a essa temática, sobretudo, as próprias organizações religiosas que pouco tem se mobilizado por se fazer exercer o direito à assistência religiosa ao preso e o direito de sua prestação por estas organizações.

*Artigo originalmente publicado em 26/02/2016.

* Sergio Gonçalves de Amorim. Possui pós-doutorado em Estudos Estratégicos pelo Instituto de Estudos Estratégicos da Universidade Federal Fluminense (INEST/UFF, 2013), é doutor em Ciências da Religião pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP, 2011) e mestre em Teologia pela Faculdade Teológica Batista de São Paulo (FTBSP, 2008). Concluiu Licenciatura (1999) e Bacharelado (1997) em Ciências Sociais com habilitação em Antropologia Social pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP).

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